25.9.12

Tão caricata

«Na melhor poesia, como na melhor literatura em geral, existe sempre uma intenção, explícita ou não, de resistência. A quê? À fealdade, à mentira e à estupidificação promovidas pelos oligopólios de comunicação social.
  
Nesse desiderato, um poeta não pode deixar de declarar guerra a todo o género de clichés: verbais, desde logo, mas também políticos, filosóficos, psicológicos, etc. Mas sem nunca perder de vista que, numa era de comunicação de massas, essa sua guerra é tão desigual, e portanto tão caricata, como a guerra que uma sardinha (zangada) decidisse mover a um petroleiro (de aço).»
  
José Miguel Silva
copiado daqui

23.9.12

Ficar perto

«O que sempre procuro na poesia: uma espécie de beleza arrepiante, desarmada, de efeito emocional e epidérmico semelhante ao da música. Não tenho outro critério para avaliar a poesia: aquela que me convém tem de ficar perto do coração e dos sentidos.»

Rui Pires Cabral
Relâmpago, nº12

7.9.12

Arte

É natural que num meio pequeno certas relações existam e se tornem explícitas. Existem consequências, claro, e um escritor deve estar preparado para que os seus textos sejam avaliados sem que se separe a arte da vida. Por vezes, no entanto, dá-se mais atenção à vida do que à arte. Custa-me ver a arte esquecida, mas não me oponho a ninguém, apenas encontro mais interesse nas combinações pessoais. E na minha própria combinação a arte é determinante.

4.9.12

Atenção

Aqueles que apontam o dedo e estendem a língua de fora escrevem conscientes do tempo e do mundo onde se inserem. Mas ao acusarem o vício de quem escreve uma poesia demasiado centrada na forma, acabam muitas vezes por desvalorizar a própria forma. E se é verdade que cada poeta deve assumir o seu papel e escrever como bem lhe entender, num tempo onde escolas poéticas já não fazem sentido, também me parece verdadeiro que a melhor poesia é aquela que junta conteúdo e forma em perfeita harmonia. Ou seja, em vez de se escrever contra a própria escrita, acho que chegou o tempo de dar mais atenção ao poema. Para que se deixe de gastar a mesma tecla e se possa dar um passo em frente.

Aparências

No prefácio à antologia Poetas sem Qualidades, Manuel de Freitas desmarcou-se dos ourives de bairro da poesia portuguesa e o gesto foi tão significativo que passado não sei quantos anos a questão ainda dá que falar. Em Deitar a Língua de Fora, segundo deduzo da crítica de António Guerreiro, pretende-se uma linguagem verdadeira, consciente do que a rodeia; uma linguagem que desafie, portanto, quem procura apenas o estilo e a aparência, deixando a realidade de fora. Eu concordo com isto e, de facto, não me ocorre nada mais irritante do que um poema magnificamente cinzelado, que depois não diz nada. Mas é uma opção do poeta e o máximo que pode acontecer é o leitor não se interessar.

2.9.12

Língua de fora

Na crítica de António Guerreiro a Deitar a língua de fora, da editora Língua Morta, não há uma palavra sequer sobre a qualidade dos poemas que compõem o volume. O crítico do Expresso escreve sobre os critérios de organização, a escolha do título e a dimensão geral do livro - uma dimensão ética e política que procura frases verdadeiras, refutando um lirismo vago que não interroga o seu tempo. A mesma tecla, basicamente, dos poetas sem qualidades, mas com um tom ainda mais desafiante e quase rancoroso. A dada altura diz que há 29 poemas de 10 autores, mas acerca da qualidade dos respectivos poemas não há uma palavra. Era principalmente isso que me podia interessar na crítica, mas ou António Guerreiro se esqueceu de falar dos poemas ou não o achou essencial.